Hoje, ao ler Dinastia X e Poderes dos X, olho para trás e lembro vagamente quando os X-Men estrearam nos cinemas, há 19 anos para ser mais exato. Foi bacana ver todos aqueles efeitos especiais da época, raios laser saindo dos olhos, garras de adamantium entre as articulações, Instituo Para Jovens Especiais e tudo mais. Era um universo novo pra mim.
Ainda me recordo da leveza na voz de Patrick Stewart como Professor Charles Xavier logo no início do primeiro filme da franquia que se iniciou pelas mãos de Bryan Singer.
“Mutação, é a chave para a nossa evolução.”
Bons tempos aqueles.
Já na adolescência descobri o gosto por desenhos animados da Marvel e DC, e era demais! Mas por mais que eu acompanhasse alguns episódios eu tinha um conhecimento raso do universo deles, acho que foi aí que entrou a vontade de ler HQs.
Quem poderia imaginar que aquela franquia seria uma das responsáveis pelo BOOM dos super-heróis nos cinemas, e na minha vida – é claro, sem tirar o mérito do Homem de Ferro feito com maestria pelo nosso queridíssimo Robert Downey Jr., até por que essa resenha se trata dos mutantes.
Normalmente, quando consigo uma folga e um tempinho para mim, procuro focar em séries, filmes, animações e afins. Dessa vez resolvi focar nas histórias em quadrinhos, o problema é que com exceção das revistas de Miles Morales e seu Aranhaverso nada parecia me agradar, mas por sorte me deparei com o novo arco dos X-Men: Dinastia X e Poderes dos X (House of X e Powers of X, títulos originais).
Dinastia X e Poderes dos X são duas minisséries que andam de mãos dadas, com seis edições cada, que funcionam como uma espécie de introdução para a nova era dos mutantes: Aurora de X (Dawn of X).
Não existe um motivo aparente que justifique a divisão dessa minissérie em duas partes, a não ser uma requintada jogada de marketing, nada mais. Mas não se iludam, pois isso não tira a beleza da obra, muito pelo contrário, até contribui no ritmo de fluidez da narrativa.
Confesso que antes de ler eu já havia ouvido falar dessas duas histórias, porém após os eventos infames como; Vingadores vs X-Men, O Vórtice Negro, Vingadores e X-Men: EIXO e A Morte do X eu sinceramente estava com minhas expectativas muito baixas, porém novamente fui traído pelo meu instinto, o que é bom – em alguns casos.
O mega escritor Jonathan Hickman – responsável por Guerras Secretas, Quarteto Fantástico e East of West – assumiu a tarefa de reinventar a mutandade.
Nesse novo evento vemos Charles Xavier abrir mão de sua conduta pacifista e adotar uma nova postura mais minuciosa, mas com um tom levemente sutil referente ao convívio turbulento com humanos. Não, não é o conflito físico que Xavier busca, e sim a aceitação dos deles, querem eles ou não. Parafraseando um dos antigos ex-técnicos da seleção brasileira, Zagalo: “Vocês vão ter que me engolir“. Brincadeiras à parte é basicamente assim que a nova era dos mutantes começa.
Essa nova abordagem não pode ser vista com tom negativo, mas sim necessário – e honestamente tardio, pois quem é familiarizado, mesmo de maneira rasa, com os X-Men sabe muito bem que direitos iguais e a política da boa convivência não são dadas aos mutantes. No sentido figurado, se existisse uma pirâmide que explicasse o conceito de popularidade no universo da Marvel Comics, os mutantes estariam na base, e não digo isso me baseando no “achismo” e sim que isso é um fato, tanto que para criação dos X-Men, isso em meados dos anos 60, Jack Kirby e Stan Lee usaram como inspiração a luta pelos Direitos Civis que a comunidade negra passava naquele momento, mas esse assunto seria apropriado para abordar em outra publicação.
Continuando, Xavier buscou conviver com os humanos de forma serena, embora na teoria fosse um sonho lindo, na prática as coisas nunca tendiam para esse lado; um bom exemplo disso foi o massacre em Genosha – que foi introduzida pela primeira vez na Uncanny X-Men #235, no Brasil, X-Men #44 da Editora Abril – ilha localizada à saída da costa do Sudeste Africano, que servia de refúgio para os mutantes, até o ataque de uma Sentinela gigante do tamanho de um arranha céu – o massacre resultou na morte de mais de 16 milhões de mutantes.
De lá para cá a mutandade fez o que faz de melhor: sobreviveu.
Logo no início de Dinastia X podemos ver que Charles Xavier uniu-se a Erik Lensherr – mais conhecido como Magneto – para que seus planos possam ter êxito. Mas que planos são esses? Simples, reunir toda a população mutante – heróis e vilões – em uma ilha, mais precisamente a Ilha Viva Mutante Krakoa, um ecossistema vivo que tem total controle de toda matéria que exista em seu interior e superfície, localizada no Oceano Pacífico.
De maneira bem descritiva, e com uma bela arte de Pepe Larraz e de R.B. Silva a minissérie não desaponta, pode sim ter alguns pontos no roteiro que poderiam ser mais trabalhados e aprofundados, mas são detalhes pequenos de mais para serem levados em consideração, exemplo disso é o Massacre de Genosha ter ocorrido e custado muitas vidas mutantes e como solução Xavier resolveu colocar toda comunidade mutante em outra ilha (?). Mas como disse, não é algo que chegue a prejudicar o enredo.
Já um dos pontos que achei sensacional nesse arco é fato de Jonathan Hickman ter tido o total cuidado ao introduzir um novo idioma para o povo mutante; Krakoano.
O idioma é rapidamente implantado no cérebro, telepaticamente, de cada mutante logo que este entra na Ilha de Krakoa. Hickman explica, através de Magneto que não é possível criar uma cultura distinta sem uma forma de comunicação.
Porém, esse pontapé revolucionário não seria possível sem uma mutante especifica: Moira McTaggert – que deu as caras pela primeira vez em Uncanny X-Men #96, de Dezembro de 1975. Graças a ela uma nova Era para os mutantes começou a nascer.
Na época em que apareceu pela primeira vez, Moira era apenas uma cientista especialista em assuntos mutantes e romanticamente envolvida com Professor Xavier, porém, Hickman decide mudar isso em Dinastia X #2. E conforme a história desenrola é revelado que Moira McTaggert é uma mutante capaz de ressurgir sempre que morre, mas suas habilidades como mutante não acabam por aí, junto com esse poder de voltar a vida suas memórias das vidas anteriores são preservadas. Por conta disso a capacidade de informação e conhecimento que Moira carrega é absurdamente extensa. Sempre que Moira morre ela retorna para a barriga de sua mãe.
Onde entra Xavier nisso tudo?
Como já sabemos, Charles Xavier sempre quis que humanos e mutantes convivessem de forma pacífica, porém isso nunca aconteceu, embora os X-Men em diversos momentos salvaram vidas humanas, em troca disso sempre foram perseguidos e hostilizados, mas esse cenário começa a mudar quando Moira entra em contato com Xavier em uma sua atual vida, onde se passa todo o evento.
Moira deixa que Xavier leia sua mente e por conta disso fica a par de todas as vidas que Moira viveu, e em todas, com exceção da primeira – pois viveu uma vida plena e sem conhecimento de que era uma mutante – os mutantes acabam por serem exterminados.
Antes de Moira morrer, Sina explica que como possui o dom de prever o futuro, suas habilidades estão, teoricamente, interligadas com as de Moira – tudo que Moira pensar em fazer que possa prejudicar a mutandade Sina saberá e a matará. Se Moira pensar em matar Sina a mesma saberá e irá prevenir isso. Com as mãos amarradas Moira parte para uma nova abordagem em prol dos mutantes, indo de assassina de Bolivar Trask – responsável por fabricar e iniciar o Programa Sentinela – até alianças com Magneto e Apocalipse.
Um detalhe importante que funciona perfeitamente conforme a leitura vai avançando é que em dados momentos Hickman nos apresenta informativos lembrando páginas de algum documento secreto feito por mutantes, destacando cada característica, por exemplo, do Nível Ômega que alguns mutantes possuem. Não só isso, como também espécie de diários escritos por Moira como forma de passar de maneira polida situações vividas por ela – como linhas e gráficos das “linhas temporais” das vidas de Moira.
E para finalizar, segue um dos diálogos de Charles Xavier para todos os humanos da terra em Dinastia X #6.
ATENÇÃO, SPOILERS!
“Humanos do planeta tTerra… Eu sou o mutante Charles Xavier, e eu trago a vocês uma mensagem de esperança.
Nos dias porvir, vocês ficarão cientes de diversos e importantes avanços farmacêuticos que foram descobertos por cientistas mutantes. Estes medicamentos estendem a vida humana, curam doenças mentais e irão prevenir… ou até curar… a maioria das doenças comuns. Influenza, Alzheimer, ELA, muitos cânceres… sumirão da noite para o dia.
Esses medicamentos tornarão a vida neste planeta melhor. Consideravelmente. Tudo isso… fizemos por vocês. No passado eles teriam sido um presente. Algo que seria dado livremente por mim… para vocês… porque eu acreditava que criaria harmonia entre nossos povos. Este era o meu sonho… de harmonia… mas vocês me ensinaram uma dura lição: Este sonho era uma mentira.
Vejam bem, tudo que eu sempre quis era paz entre humanos e mutantes. Tudo que sempre quis era amá-los e que vocês nos amassem. Nós queríamos salvá-los… e o fizemos diversas vezes… mas, em troca, tudo que fizeram foram ficar imóveis enquanto homens malignos matavam nossos filhos. Cerca de 16 milhões deles. Então não haverá um presente… pois vocês não merecem. Nós iremos… entretanto… deixar que paguem por eles. Em troca de duas coisas, nós garantiremos que tenham uma vida melhor. Sem dor ou sofrimento e cheia de esperanças… e isso custará muito pouco para vocês.
Primeiro, vocês devem aceitar a Ilha de Krakoa como um Estado-Nação de todos os mutantes deste planeta. Nós passaremos de bom grado pelo processo da ONU assim como qualquer nação recém-formada, mas há uma expectativa que nossa soberania seja reconhecida.
Segundo, todos os mutantes… desde o nascimento… podem clamar por ser cidadãos Krakoanos. E com essa cidadania, esperamos um período de anistia. Para que aqueles que foram assinalados como criminosos… ou punidos e aprisionados por humanos… possam superar o preconceito humano contra mutantes.
Deste dia em diante, mutantes serão julgados por leis mutantes, não humanas. Essas são nossas simples demandas, e não são negociáveis. Em troca de tornar nossas vidas melhores, faremos o mesmo por vocês. E, se estiverem se perguntando, quem esses mutantes pensam que são para poderem ditar regras para nós? Nós somos o futuro. Uma inevitabilidade evolucionária. Os verdadeiros herdeiros da Terra. Vocês foram dormir ontem à noite acreditando que o mundo seria seu para sempre. Este eram seu sonho. E, como o meu… era uma mentira. Esta é a nova verdade: Enquanto vocês dormiam, o mundo mudou.”
E é com esse diálogo/monólogo que me despeço.
Dinastia X e Poderes dos X é de longe uma das histórias mais interessantes que já li, fora que é uma leitura que flui, com diálogos muito bem construídos e sem contar que foi escrita por Jonathan Hickman, então vá tranquilo que as HQ valem a pena!
Segue a cronologia de leitura da minissérie:
• Dinastia X #1
• Poderes dos X #1
• Dinastia X #2
• Poderes dos X #2
• Poderes dos X #3
• Dinastia X #3
• Dinastia X #4
• Poderes dos X #4
• Dinastia X #5
• Poderes dos X #5
• Dinastia X #6
• Poderes dos X #6
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