No último mês, recebemos o incrível Coraline, uma das obras mais assustadoras de Neil Gaiman. A versão lançada pela Rocco, vem ao Brasil no formato quadrinho e com ilustrações maravilhosas de P. Craig Russel. A parceria vem de mais de 30 anos, com o ilustrador já tendo adaptado diversos livros do autor.
Coraline ganhou os holofotes quando foi adaptado para animação stop-motion em 2009. E desde então, Gaiman tem tido cada vez mais mais destaque, com suas obras ganhando cada vez mais versões live-action, como foi com Lucifer – uma adaptação livre do personagem criado por Gaiman -, Deuses Americanos, Good Omens e o incrível Sandman.
A edição lançada no Brasil pela Editora Rocco faz um trabalho brilhante ao colocar na trama elementos factíveis, e uma ilustração bem mais humana e real. Focando quase que inteiramente no horror que é, ver humanos como os conhecemos com olhos de botões.
Trazemos neste artigo alguns pontos que foram adaptados da obra original de Neil Gaiman, tendo muito ou quase nenhum impacto sobre a trama original.
A DIFERENÇA GRÁFICA ENTRE O QUADRINHO E A ANIMAÇÃO
O quadrinho da Editora Rocco traz uma ilustração muito mais pé no chão do que o que foi visto na animação. Com elementos estilizados e visuais espalhafatosos, Coraline de 2009 contou com um estilo gráfico único. A ilustração de Russell é tão real quanto assustadora. E daí, vem o mais pesado aspecto desta história: ver humanos se transformar em criaturas horrendas, com grandes dedos que lembram garras e enormes dentes com sorrisos maléficos. E os olhos de botão são apenas a cereja do bolo.
WYBIE NÃO EXISTE NO LIVRO
Caso você tenha assistido a animação antes de ler o quadrinho, não se assuste ao não encontrar um dos mais intrépidos personagens do filme de 2009. Wybie tem um papel importante no filme e serve por vezes como um “guia” de Coraline pelo que ele se refere como a “Casa Rosa”.
No livro, Coraline é sua própria guia e o fato de ser uma “exploradora”, dá ainda mais destaque à personagem e sua amizade com O Gato, seu fiel confidente e protetor.
CORALINE MORA ORIGINALMENTE NA INGLATERRA E NÃO NOS ESTADOS UNIDOS
Não que isso influencie muito a história, mas a mudança de um continente ao outro estão basicamente ligadas aos hábitos de consumo de Coraline e seus pais. O diretor Henry Selick optou por ambientar o filme no Oregon pois havia escalado em grande parte atores americanos para o filme. As únicas personagens que mantiveram sua nacionalidade inglesa, foram as vizinhas de Caroline, a Srta. Spink e a Srta. Forcible.
A PERSONALIDADE DE CORALINE MUDOU COMPLETAMENTE
No quadrinho, Coraline é vista como uma jovem paciente, curiosa e resiliente, passando por vezes por apuros para evitar maiores conflitos sem reagir. No filme, ela é colocada como uma personagem reativa e é quase sempre vista como uma garota mal-humorada e difícil de lidar.
A forma como Gaiman descreve a personagem no livro, a coloca como uma criança inteligente, observadora e quieta. Já a versão do filme a faz se apresentar como uma personagem independente, por vezes mais audaciosa e mais respondona.
O OUTRO MUNDO É COMPLETAMENTE DIFERENTE
Ainda que o outro mundo pelo qual Coraline adentra não engane nossa protagonista no livro, a sua contraparte do longa se vê capturada por características únicas daquele lugar. Como um mundo lúdico e “reativo”, o diretor cria no longa sequências super interessantes que prenderiam a atenção de qualquer criança, dando aquele lugar um tom mais alegre e mais animador do que o mundo real, no qual nossa personagem vive.
A BONECA DE PANO COM OLHOS DE BOTÃO
Mais um elemento interessante do longa está contido em sua sequência inicial. O filme de Henry Selick nos apresenta a ameaça que Coraline enfrentará desde seus primeiros momentos. Com mãos que lembram agulhas e alfinetes, vemos uma boneca de pano ser construída com partes de outras até ganhar a forma de Coraline.
O filme estabelece que essa é uma das táticas da outra mãe de atrair crianças para seu mundo. Wybie tem mais um papel no longa além de servir como um guia, ele entrega a boneca que parece ter surgido em sua vida à Coraline. A jovem a partir dali leva a boneca para todos os lados em suas aventuras e explorações.
A boneca não é um elemento narrativo da história original de Gaiman, tendo sido criada inteiramente pelo diretor para o filme.
O OUTRO MUNDO
Quando Coraline fica presa no outro mundo e tenta fugir pela porta da frente da Casa Rosa, ela percebe que uma forte névoa cerca o lugar. Quando o gato conta a ela que é impossível fugir dali, ela não desiste e caminha até os confins daquele lugar. Como uma espécie de reprodução do mundo real, a outra mãe parece ter copiado apenas o que mais lhe interessa para prender a jovem do outro mundo: a casa e o jardim da frente. Quanto mais Coraline adentra a névoa, menos ela vê, pois não há mais nada ali, a não ser a casa e o jardim da frente.
Enquanto tenta se encaminhar para o ponto mais equidistante em relação à casa, Coraline retorna ao ponto de partida. Mostrando que aquele universo não é infinito, como o nosso.
A diferença está aí. No filme, a outra mãe cria para Coraline em uma tentativa de fazê-la ficar, um jardim com o formato de seu rosto. Repleto de magia e mistério, o lugar é cenário de um importante conflito que se dará ao final da história.
A OUTRA MÃE É MAIS ASSUSTADORA NO LIVRO
Ainda que a outra mãe de Coraline se transforme em uma das criaturas que a protagonista mais tem medo – uma espécie de aranha gigantesca -, o que quadrinho acaba por causar aos seus leitores uma sensação de perigo muito maior. Seja por seu estilo gráfico mais realista, que aliado ao texto de Gaiman nos causam um maior incômodo, vemos a história se desenrolar sem saber a extensão do poder do inimigo que Coraline enfrenta, o que é diferente no filme.
Algumas linhas de diálogo inclusive servem para nos causar um incômodo singular, estabelecendo o que a outra mãe é capaz de toda e qualquer coisa para obter seu objetivo.
FINAIS DIFERENTES
Na versão do filme, Wybie auxilia Coraline a se livrar da mão. O que é anticlimático e coloca a personagem de natureza independente como dependente da ajuda de alguém para salvar sua própria vida e aquela realidade.
O final do livro é bem mais interessante do que a versão do filme, pois diferente do fato da personagem precisar da ajuda de alguém para vencer o mal que ela enfrenta, ela descobre tudo sozinha. Um dos elementos mais interessantes da história é que Coraline vê sua vida ter alguns dias de tranquilidade antes de retornar à ação. E após alguns dias de descanso, enquanto a outra mãe tentava cruzar para seu mundo, ela monta uma armadilha e prende a mão no fundo do poço.
O quadrinho da Editora Rocco nos lança pelos mais diversos mistérios, mas causa certos incômodos. Mais incômodos do que a animação de 2009. O quadrinho está disponível para venda.
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