TBT #123 | Eles Vivem (1988, John Carpenter)

    O TBT dessa semana é dedicado ao filme Eles Vivem (They Live) do diretor John Carpenter (Halloween). O longa, que foi de filme B a filme cult, é baseado no conto Eight O’Clock in the Morning, de Ray Nelson. Na história, um homem acorda de um transe e descobre que o planeta é controlado por alienígenas disfarçados.

    Em sua época, Eles Vivem teve um considerado sucesso nos cinemas, mas foi visto como “sem profundidade” pelos críticos. No elenco estão Roddy Piper, Keith David e Meg Foster. Carpenter também assina o roteiro sob o pseudônimo de Frank Armitage, em homenagem a um personagem de H.P. Lovecraft.

    SINOPSE

    John Nada (Roddy Piper) é um trabalhador braçal que chega a Los Angeles e encontra trabalho em uma obra. Durante uma inusitada operação repressiva, a polícia destrói um quarteirão inteiro do bairro miserável em que vive. Na confusão, Nada encontra óculos escuros aparentemente comuns, porém ao usá-los consegue enxergar a verdade horrenda por trás de um mundo consumista.

    ANÁLISE DE ELES VIVEM

    Nos anos 1980, os Estados Unidos se viram sob a Era Reagan que administrada pelo então presidente americano, Ronald Reagan (1981 – 1989), defendia o capitalismo exacerbado. O consumo sem consciência foi uma febre americana, que existe até hoje no mundo inteiro. Somos levados a comprar coisas sem antes refletir nossas reais necessidades, fechando os olhos para os problemas da sociedade.

    Antes mesmo de Neo acordar da Matrix em 1999, John Carpenter já tinha sacado essa “louca obsessão americana” por uma falsa realidade. Em 1988, Eles Vivem fez uma crítica sociopolítica ao contar a história de um homem que descobre que o planeta é controlado por uma raça alienígena disfarçada entre os seres humanos da sociedade.

    Carpenter contou, em uma entrevista, que seu filme era uma crítica ao seu descontentamento com o governo Reagan e a política econômica interna dos Estados Unidos. Em forma de sátira, o diretor tratou do consumismo desenfreado da época e também da geração yuppie – termo usado para se referir a jovens profissionais de situação financeira intermediária entre a classe média e a classe alta.

    Dirigido por John Carpenter, Eles Vivem (They Live) foi de filme B a cult, e conta uma história que estimula uma reflexão que continua atual

    O discurso realista e amargo do diretor vai de encontro a uma época que não estava preocupada com os problemas sociais, econômicos e políticos que o capitalismo poderia trazer. O famoso “American Dream” ainda estava em alta e, mais do nunca, o dinheiro era Deus. Por isso, Eles Vivem é um caso peculiar na filmografia dos anos 1980 ao trazer uma ficção científica que mistura elementos de terror, ação, suspense e, até mesmo, humor.

    Na história, John Nada acha um óculos capaz de mostrar a realidade, na qual as propagandas escondem mensagens subliminares de obediência e servidão. Mais do que isso, os alienígenas que estão entre a sociedade trabalham para escravizar a humanidade e tomar a atmosfera. Para esses seres, o planeta Terra é o terceiro mundo.

    Dessa forma, John e seu amigo Frank (Keith David) decidem se engajar no movimento de resistência, que é perseguido como subversivo pela polícia. Tudo em Eles Vivem é nítido e direto. Carpenter é incisivo em seu roteiro, criando uma obra que consegue dialogar através de décadas.

    O filme também trata sobre como os humanos se vendem facilmente para uma outra elite dominante, no simples e velho “quem paga mais”. Além disso, a trama aborda o governo como massa de manobra, os perigos da autoridade sem questionamento e a manipulação da mídia.

    Essas questões vão de encontro a uma população marginalizada que vive em barracas nos arredores da cidade, é ali que o espectador assiste à repressão policial e à instauração do medo.

    Outro momento marcante do longa é a cena de luta entre John e Frank, que dura cerca de seis minutos. Para fazer seu amigo usar os óculos e ver a realidade, John entra em confronto. Isso denota que, por muitas vezes, ver a verdade pode ser mais difícil e dolorido do que pensávamos.

    Sendo assim, também vale comentar o design de produção dos alienígenas que Carpenter usou em Eles Vivem. Conhecido por criar criaturas memoráveis como em O Enigma de Outro Mundo, o diretor conta que os aliens do filme se parecem com os humanos, pois na mesma medida que estão nos corrompendo, são seres corrompidos.

    Por isso, Eles Vivem é um longa que merece sempre ser revisitado e lembrado. Seu discurso não é só atual, como busca fazer uma reflexão sobre a sociedade manipuladora e consumidora. Observar e enxergar foras dos parâmetros pode ser cruel, mas é melhor do que viver sob uma falsa bandeira. Você só precisa colocar os óculos.

    VEREDITO

    Eles Vivem traz um discurso crucial para o mundo capitalista, através de uma crítica sociopolítica que perdura até hoje. Em forma de filme B de ação com frases de efeitos e atuações duvidosas, o longa é divertido e consegue passar sua mensagem final.

    O filme de John Carpenter está disponível na Netflix. Clique aqui para assistir.

    Nossa nota

    4,0 / 5,0

    Assista ao trailer:

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