CRÍTICA – Cidade Invisível (1ª temporada, 2021, Netflix)

    Cidade Invisível é a nova série brasileira da Netflix criada por Carlos Saldanha (Rio) e, roteirizada por Raphael Draccon e Carolina Munhóz. No elenco estão Marco Pigossi, Alessandra Negrini, Fábio Lago e Julia Konrad.

    SINOPSE

    Em Cidade Invisível, um mundo subterrâneo é habitado por criaturas míticas evoluídas de uma linhagem profunda do folclore brasileiro. Em um período conturbado, o detetive Eric (Marco Pigossi) se encontra preso em uma investigação de assassinato que o coloca no meio de uma batalha entre esses dois mundos.

    ANÁLISE

    Quando a Marvel estreou nos cinemas trazendo personagens da mitologia nórdica, o público viu que era possível atualizar tradições para o mundo contemporâneo. Dessa forma, sem perder o misticismo, outras produções como American Gods também tiveram a proeza de contar sobre o antigo, com olhos no presente.

    Mas, não é somente a mitologia eurocêntrica que se beneficia disso, a série brasileira Cidade Invisível chega para mostrar a força do folclore brasileiro. Até porque, muito além de Thor, Odin e Loki, o Brasil é farto em histórias com incríveis personagens mitológicos.

    Por isso, é essencial o espectador esquecer a Cuca como o jacaré loiro do Sítio do Pica Pau Amarelo. Na série, o tom misterioso, fantasioso e até mesmo ameaçador põe em xeque entidades como Saci, Curupira, Boto, Iara e a própria Cuca. Logo, nas ruas do Rio de Janeiro, esses personagens adaptaram-se a um contexto mais urbano e social.

    Consequentemente, Cidade Invisível traz o personagem de Marco Pigossi para o centro da trama. Eric é um detetive da polícia ambiental muito focado em seu trabalho e demonstra não ter muito tempo para a família. Contudo, após a misteriosa morte de sua esposa Gabriela (Julia Konrad), ele se vê sozinho com a sua filha, Luna (Manu Dieguez).

    Apesar dos maneirismos hollywoodianos que impõe em Eric o temperamento do policial contrário ao sistema, o personagem carrega uma grande dramaticidade que graças à atuação de Pigossi nunca chega ao extremo. Sendo assim, o protagonista é quem movimenta a trama estando ligado diretamente aos acontecimentos.

    Aliás, o detetive encarna o passado, o presente e até mesmo o futuro de Cidade Invisível. Sendo assim, cada personagem a sua volta ganha um certo espaço para sua própria narrativa. Logo, a série busca apresentar as entidades místicas de uma forma mais visual e didática com o espectador.

    Com isso em vista, a Cuca vivida por Alessandra Negrini é a personagem com mais tempo de tela para se desenvolver, quase como uma suposta vilã, a narrativa faz questão de construir um certo temor em volta dela. Nessa medida, apenas sete episódios com no máximo 40 minutos de duração é insuficiente para saciar a vontade de ver esses seres sobrenaturais em tela.

    O povo brasileiro que carece de sua própria cultura encontra em Cidade Invisível um sentimento de pertencimento. Por isso, quando a série opta por esquecer personagens introduzidos no começo da trama, como o próprio Saci (Wesley Guimarães) para somente relembrá-lo no ápice final, a sensação que fica é de ausência. Dessa forma, o espectador anseia por mais desse personagem tão especial.

    Tradição versus progresso

    Carlos Saldanha parece ter uma visão bem clara do que almeja com Cidade Invisível e mesmo em segundo plano, as discussões sobre tradição e progresso são bem colocadas. Na ilha de pescadores na qual Gabriela trabalhava, uma empreiteira quer retirar os moradores do local para o desmatamento.

    No mesmo lugar, vivia o Curupira, interpretado incrivelmente por Fábio Lago que utiliza de uma atuação carregada em maneirismos e trejeitos para dar vida a entidade. Contudo, com a urbanização e o desmatamento da mata, o protetor das florestas é obrigado a ir para a cidade.

    Logo, alguns moradores da ilha encabeçados por Ciço (José Dumont), um velho que acredita nas entidades, lutam sozinhos para barrar esse progresso forçado. Essa narrativa colabora para a ameaça principal que ronda os personagens folclóricos e, os coloca frente a um mundo que constantemente se adapta e moderniza.

    Contudo, Cuca e companhia em nenhum momento pensam sobre o peso dessa ameaça, não existe uma discussão sobre o mal que o homem moderno pode causar. Talvez porque as entidades estão conformadas e lutam somente pela sobrevivência ou porque é um assunto para uma outra temporada.

    O fato é que Cidade Invisível busca tratar sobre a cultura brasileira de forma adulta, sem enfeites ou rodeios. E da mesma forma que é pura fantasia, também consegue ser realista. Dessa maneira, a série surge em um momento no qual precisamos mais do que tudo resgatar origens e tradições para que haja um futuro com a cara do povo brasileiro.

    VEREDITO

    Cidade Invisível traz de volta os mitos do folclore brasileiro para contar uma história sobre tradição e adaptação. Além disso, por ser uma produção da Netflix, a série ganha certa notoriedade e peso.

    O fato de se passar no Rio de Janeiro provoca um certo apagamento do Norte e Nordeste, visto que a maioria dessas entidades se originou nesses espaços. Contudo, como o Brasil é gigante, podemos torcer por uma segunda temporada com mais personagens folclóricos em outras regiões.

    Nossa nota

    4,5 / 5,0

    Assista ao trailer:

    Curte nosso trabalho? Que tal nos ajudar a mantê-lo?

    Ser um site independente no Brasil não é fácil. Nossa equipe que trabalha – de forma colaborativa e com muito amor – para trazer conteúdos para você todos os dias, será imensamente grata pela sua colaboração. Conheça mais da nossa campanha no Apoia.se e nos ajude com sua contribuição.

    Artigos relacionados

    CRÍTICA: ‘The Last Days of Ptolemy Grey’ é sobre fins, começos e reflexões

    'The Last Days of Ptolomy Grey' é uma joia escondida na AppleTV. Estrelada por Samuel L. Jackson, e grande elenco, o acompanhamos em uma jornada emocional e profunda.

    CRÍTICA: ‘Unicorn: Warriors Eternal’ dos épicos de fantasia aos filmes de artes marciais

    Unicorn: Warriors Eternal nos lança por uma história e por um visual deslumbrantes. Criado por Genndy Tartakovsky.

    Lançamentos Netflix: Veja o que chega em abril

    Abril já está chegando e nada melhor que ficar por dentro dos próximos lançamentos Netflix! Veja as produções da gigante do streaming.

    Magnatas do Crime: Conheça os personagens da série

    Bem-vindo a Magnatas do Crime, uma série que expõe o nefasto submundo que se esconde sob a refinada sociedade da aristocracia britânica.