Antes de a Marvel faturar bilhões com o sucesso de seu universo compartilhado, e antes da DC investir no sombrio e realista nas telonas, M. Night Shyamalan (A Vila e Sinais) já apostava em uma narrativa que viria a se tornar muito importante para o cinema de herói com o aclamado Corpo Fechado (Unbreakable, 2000), o quarto filme do diretor indiano.
Corpo Fechado conta a história de David Dunn, interpretado pelo Bruce Willis (ator que já havia trabalhado com Shyamalan um ano antes no incrível Sexto Sentido), um homem amargurado cujo casamento está em crise e cujo emprego de segurança em um estádio não parece satisfazê-lo. Certo dia, ao retornar de mais uma entrevista, o trem em que ele se encontra descarrilha e todos os passageiros morrem – menos David, que sobrevive sem nenhum arranhão. Logo depois do ocorrido, ele é procurado por um apreciador de quadrinhos, Elijah Price, vivido pelo Samuel L. Jackson (Pulp Fiction), o qual é portador de uma rara doença genética (osteogenesis imperfecta) que torna seus ossos pouco densos e, portanto, passíveis de fraturas constantes. Impressionado com a história de David, Elijah tenta convencê-lo de que ele tem superpoderes.
O filme apresenta a seguinte premissa: como seria se os super-heróis existissem no mundo real?
M. Night Shyamalan pega essa premissa e cria em seu longa uma trama que apresenta uma jornada de autoconhecimento e aceitação. O diretor opta por não utilizar efeitos extraordinários ou cenas de ação megalomaníacas, e foca no desenvolvimento de seus personagens, criação de tensão, movimentos de câmeras invejáveis e em questionamentos constantes sobre o que estamos vendo em tela.
O diretor também trabalha a estética do filme de maneira muito criativa, o uso das cores, por exemplo, é muito inteligente e marcante. Shyamalan, ao caracterizar seus personagens através das cores, fez algo que viria a se tornar muito comum nas séries da Marvel na Netflix, como Defensores. O diretor atribuiu o verde ao David Dunn e o roxo ao Elijah Price, dessa forma ele introduziu quase que discretamente uma espécie de código para que o público identificasse o herói e o vilão do filme. No entanto, a utilização desse recurso é bem sútil, não chega ser explosão de cores como vimos em Thor: Ragnarok, é bem mais contido, até porque, por mais que tenha muita influência dos quadrinhos, estamos falando aqui de uma obra de suspense.
Por falar em influência dos quadrinhos, podemos observar também outra sacada do diretor – que é assumidamente um grande fã de HQs – quando ele escolheu o nome de seu protagonista, David Dunn. A repetição do “D” lembra personagens da Marvel como Bruce Banner, Peter Parker e Matt Murdock.
Corpo Fechado não tem apenas acertos, mesmo conseguindo prender o espectador do início ao fim da projeção, colocando sempre novas pistas e mantendo o público instigado, chega um determinado momento no qual a narrativa se torna muito lenta, algo que pode incomodar algumas pessoas.
Atenção! A partir daqui o texto contem spoilers. Se você ainda não assistiu a nenhum dos filmes que compõem a trilogia de M. Night Shyamalan, continue por sua conta e risco.
A TRILOGIA DE SHYAMALAN
Corpo Fechado foi o primeiro longa de uma trilogia composta por mais duas obras: Fragmentado (Split, 2017) e Vidro (Glass, 2019) – confira a nossa crítica clicando aqui. Porém, só foi revelado ao público que se tratava do mesmo universo no plot twist de Fragmentado quando, ao final do filme, o personagem David Dunn aparece. No entanto, o roteiro original de Corpo Fechado já tinha a ideia dos outros longas que compõem a saga de Mr. Glass, A Fera e David. No painel na CCXP 2018, o diretor e roteirista, M. Night Shyamalan disse:
“Eu sempre planejei contar essa história, só demorou muito para que eu conseguisse contar tudo o que queria.”
Falando do motivo que o levou a adiar a conclusão da trilogia por 19 anos, o diretor falou:
“Sabe, quando estava escrevendo Corpo Fechado, estava pensando em fazer a trilogia. Contudo, Corpo Fechado foi o primeiro do tipo de filme de quadrinhos, e estranhamente, quadrinhos eram considerados uma coisa não muito comercial. E a teoria era que eles [estúdio] pensavam era que apenas pessoas que vão em convenções atrás de quadrinhos veriam esses filmes – o que deixaria esse nicho muito pequeno.”
Após o sucesso de filmes como a trilogia do Batman de Christopher Nolan e o Universo Marvel ter explodido nas telonas, finalmente o cineasta conseguiu criar Fragmentato e, assim, pôde finalizar sua obra com Vidro.
“É o final de dois filmes diferentes, de duas gerações diferentes. É uma coisa muito rara. Eu não acho que já tenha acontecido e não acho que vá acontecer novamente. Então nos sentimos muito sortudos de poder terminar essa história e ter todos esses personagens interagindo.”
Infelizmente, a trilogia não teve um dos melhores desfechos, mas isso não tira o legado, nem a qualidade, de Corpo Fechado, que é uma obra sensacional e merece o devido reconhecimento pela importância para o cinema de herói e para a sétima arte como um todo.
Veja o trailer legendado abaixo:
Curtiu a nossa recomendação dessa semana? Já assistiu Corpo Fechado? Conta para a gente aqui nos comentários o que você achou do filme. E se estiver atrás de mais indicações, eu recomendo que você dê uma olhada nos outros TBTs do Feededigno.
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