Da decadência à inovação: Por onde andam os filmes de slasher?

    O gênero de slasher sempre esteve presente no imaginário popular. De Norman Bates, passando por Michael Myers até à franquia Pânico, esses filmes atravessam anos com continuações duvidosas, mas ainda assim, cheios de sagacidade.

    Porém, o começo desse subgênero do terror no cinema não foi nada agradável. Com cara de contracultura, os filmes de slasher sempre foram uma subversão da boa moral das famílias cristãs trazendo à tona toda hipocrisia de uma sociedade em decadência.

    Uma afronta dessas também não iria passar despercebida pelos críticos, já que sempre consideraram o gênero de terror um segmento menor do cinema. O que não impediu que o gênero de slasher caísse nas graças do público.

    Tomados pela curiosidade do sanguinolento e pelos impulsos voyeurísticos é quase catártico assistir um filme de gato e rato. Mas, voltando para o começo, após a era dos filmes de monstros, o terror do cinema foi se tornando cada vez mais realista, estando claramente influenciado pelas mudanças culturais da época.

    Os medos da sociedade em filmes de slasher 

    Janet Leigh como Marion Crane, em Psicose.

    Os anos 60 foram cruciais para formular os filmes de assassinos impiedosos. Obras como Psicose (1960) e O Massacre da Serra Elétrica (1974) deram vida aos medos de uma sociedade conservadora, enquanto punia os transgressores dos bons costumes.

    Basta lembrar da simpática Marion de Psicose que é morta por simplesmente despertar o desejo sexual de Norman. Já em O Massacre da Serra Elétrica, considerado o primeiro filme de slasher, a influência para a matança dos jovens por um canibal mascarado vem dos eventos mundiais da época como a Guerra do Vietnã.

    Mas, o gênero de slasher só foi de fato consagrado nos anos 70 e 80 com assassinos em série e franquias gananciosas. A ênfase foi na cultura hippie e punk que deram mais destaque para os jovens na sociedade. Logo, os filmes de slasher viram uma ótima oportunidade de explorar o universo adolescentes, focando principalmente nas descobertas sexuais.

    Sendo assim, o famoso Halloween (1978) de Michael Myers se tornou um ícone ao optar nos primeiros minutos de tela pela câmera subjetiva mostrando o ponto de vista do menino Michael. Mas, indo além, o filme explora as relações de gênero na sociedade e também a questão da moral.

    Assim como em Halloween, em Sexta Feira 13 (1980) e em A Hora do Pesadelo (1984) o retrato da mulher também é amplamente estereotipado. Se por um lado, os slasher foram importantes para o protagonismo feminino com as final girls, por outro, as mulheres, além de serem constantemente vítimas de violência, são vítimas de uma violência sexualizada.

    Não à toa, após onze filmes de Halloween, doze de Sexta Feira 13 e seis de A Hora do Pesadelo houve uma grande massificação e banalização do gênero. Logo, o senso de responsabilidade social foi deixado de lado para dar lugar ao lucro por saudosismo. Sendo assim, há quem diga que a época de ouro do gênero morreu com Michael Myers, Jason e Freddy Krueger. Mas, está bem longe disso.

    A nova onda de slasher  

    No final da década de 90, os filmes de slasher estavam desacreditados. Mas eis que surge a franquia Pânico (1996) e com ar de deboche traz de novo os assassinos em série para o cinema. Pânico tem claramente uma autoconsciência que é um filme de terror e por isso consegue transgredir o gênero.

    Porém, a trama caiu na mesma armadilha das franquias e rendeu quatro filmes. Aos poucos o slasher foi ficando nas sombras e dando lugar aos filmes de assombração. É comum que dentro do terror, subgêneros façam mais sucesso que outros dependendo da época e da recepção do público. Mas, o que nunca sai de moda é o medo.

    Sendo assim, o gênero de slasher migrou para a era da tecnologia e informação. Logo, usando câmeras, discussões sobre racismo e até mesmo de doenças sexualmente transmissíveis conseguiu se reinventar e ressurgir em uma nova forma.

    Corrente do Mal (2014) trabalha simbolicamente com o tabu das doenças sexualmente transmissíveis. O assassino em questão é um ser sobrenatural que irá encontrar a vítima a não quer que ela passe a maldição através do sexo.

    Em Hush – A Morte Ouve (2016) o protagonismo feminino é outra vez revivido, mas de forma mais consciente de suas imposições. Já em Nós (2019), o real terror está no racismo de forma velada, segregação social e no que separa “nós” dos outros.

    Por último, no recente The Rental (2020), o assassino segue os mesmos requisitos: uma arma branca para matar, mascarado e extremamente calculista. No entanto, ao utilizar câmeras para monitorar suas vítimas e brincar com elas, o gênero acerta em cheio no medo da invasão de privacidade.

    Dessa forma, os novos filmes de slasher são um respiro para o gênero e vai muito além dos fantasmas e monstros. Saber que outro ser humano pode ser tão maligno é o que realmente assusta uma sociedade que está 24 horas conectada.

    O slasher tem a tendência de se adaptar, pois reflete os nossos piores medos. Nada mais justo que ficarmos de olhos bem apertados para esses filmes. 

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