Neorrealismo Italiano: O movimento que transformou a sétima arte

    O neorrealismo italiano foi representado por um grupo de jovens cineastas que ofereceram ao mundo um tipo muito diferente de cinema, que até então ninguém tinha visto. Foram muitas as inovações, entre elas, o uso de locações reais, a luz natural, atores não profissionais, mudanças consideráveis na estrutura dramática, com histórias cheias de digressões e conclusões ambíguas, que depois se tornaram elementos intrínsecos do cinema moderno, de tal forma que até hoje é difícil imaginarmos como estes filmes foram tão revolucionários na época. 

    Um dos principais elementos desse cinema era o compromisso com a realidade. Por isso que o neorrealismo italiano, o cinema mais político que o mundo já produziu, talvez seja o mais apropriado para o mundo pós-pandêmico, capaz de despertar a compaixão e a consciência de que o mundo, tal como está, não é capaz de proteger os interesses do homem enquanto sociedade. 

    O MOVIMENTO

    O movimento teve expoentes na literatura reunindo, entre outros, Ítalo Calvino, Alberto Moravia e Cesare Pavese, eram adeptos do “verismo” (de vero, verdadeiro), movimento do século XIX, que também fazia a crítica social do seu tempo.

    O neorrealismo sucede, na Itália, um período marcado por produções de temática bíblica, filmes de exaltação da ideologia fascista ou melodramas em que se sobressaíam as divas. Estes eram chamados de “cinema de telefone branco”, porque feitos em estúdios que representavam residências chiques, com personagens fora da realidade italiana. Havia uma evidente tentativa de se copiar Hollywood. Os documentaristas quem tinham alguma liberdade de experimentação temática e artística, principalmente em curtas-metragens, o que chamava pouca atenção.

    Em meio a estas produções, esbarrava-se no autoritarismo católico, que controlava os circuitos de exibição e coordenava também as censuras, tudo de acordo com os “princípios morais e educativos da Igreja”. Foi então que os cineclubes começaram a destacar-se nesse cenário.

    CARACTERÍSTICAS DO NEORREALISMO ITALIANO

    A linguagem do cinema neorrealista se caracterizou pelos enquadramentos em planos de conjunto e planos médios, sem muitos closes (a câmera não conduz o espectador, só registra as cenas); recusa de efeitos visuais (sem reflexos, deformações, imagens inclinadas); filmagem em cenários reais (câmeras nas ruas); muitas improvisações em relação ao roteiro; utilização de não-atores; simplicidade dos diálogos e valorização dos dialetos; além de orçamentos de baixo custo. 

    VIDA COTIDIANA NO CONTEXTO DE POBREZA E CRISE

    Muitos italianos se sentiram desesperados, tanto em suas circunstâncias atuais quanto na falta de oportunidade para qualquer tipo de melhoria em suas vidas. Os filmes neorrealistas capturaram esse desespero, em particular o sentimento de que o futuro parecia mais sombrio do que esperançoso para muitos. Por conta disso, outra característica comum desses filmes é o final infeliz. Não haveria uma solução fácil ou uma jornada segura em direção à estabilidade e prosperidade para os italianos e os filmes refletiam isso em narrativas impressionantes.

    DEVASTAÇÃO PÓS-GUERRA

    O neorrealismo era uma mistura de técnicas tradicionais e novas, amplamente moldadas pela guerra e suas consequências. Um número relativamente pequeno de cineastas abraçou o gênero e a maioria deles trabalhou nos filmes um do outro. Os mestres do neorrealismo italiano foram Michelangelo Antonioni, Gianni Puccini, Giuseppe de Santis, Vittorio de Sica, Federico Fellini, Roberto Rossellini, Luchino Visconti e Cesare Zavattini.

    VALORIZAÇÃO DAS EMOÇÕES DOS PERSONAGENS

    Uma característica importante dos filmes neorrealistas foi a beleza e o contraste das próprias imagens. Filmado em preto e branco, esses filmes têm uma qualidade assombrosa, com sombras profundas e bordas nítidas que ecoam, não apenas a dureza da vida durante os anos do pós-guerra, mas também as emoções dos próprios personagens.

    Todas as características do gênero estão expostas em uma história bem tecida que deixa os espectadores à beira de seus assentos, espremidos emocionalmente e com uma apreciação imensa, não apenas para o cineasta, mas para os não-atores que tão brilhantemente deram vida aos seus personagens e suas dificuldades.

    5 FILMES QUE DEFINEM O NEORREALISMO ITALIANO

    Obsessão (1943)

    Itália, início dos anos 40. No miserável Vale do Pó, Giovanna (Clara Calamai), a frustrada dona de uma pensão, planeja com o amante Gino (Massino Girotti) o assassinato do marido.

    Considerado por alguns teóricos como o marco inicial do movimento, Obsessão (1943) possui características essenciais do neorrealismo. Além de retratar a vida de um casal marginalizado, o diretor explora as locações e paisagens como elementos expressivos vitais para o drama.

    Vítimas da Tormenta (1946)

    Um retrato das crianças de rua na Itália pós-guerra. Giuseppe (Rinaldo Smordoni) e Pasquale (Franco Interlenghi) são duas das crianças, dois grandes amigos que vivem de lustrar os sapatos de soldados americanos. Eles dividem suas esperanças e seus sonhos inocentes de um futuro melhor, mas acabam presos numa terrível instituição para menores. O diretor Vittorio De Sica explora muito bem a interação entre os personagens e o espaço impessoal e decadente em que eles são aprisionados.

    Dois Vinténs de Esperança (1952)

    Boscotrecase, província de Nápoles: Antonio (Vincenzo Musolino) acabou de voltar do serviço militar e está encarando a dura realidade do pós-guerra, aprendendo a arte de sobreviver. Ele tem a mãe e várias irmãs para sustentar sozinho, e por isso ele aceita todo emprego que aparece.

    O filme de Renato Castellani se adequa a uma possível vertente mais leve e até comercial do movimento que alguns teóricos chamam de “neorrealismo rosa”. Apesar da premissa dramática sobre um jovem que volta da guerra e tenta sustentar sua família, a abordagem do filme é menos pessimista e, em certos momentos, flerta até mesmo com a comédia. 

    A Terra Treme (1948)

    Um grupo de pescadores são explorados pelos comerciantes locais. Uma das famílias tenta escapar da situação fundando seu próprio comércio, mas não consegue ajuda. Em uma busca mais humana em seus filmes, o cineasta Visconti lança mão de uma abordagem crua que beira o documental.

    Ladrões de Bicicleta (1948)

    A história se passa logo após a Segunda Guerra Mundial, com a Itália destruída e o povo passando necessidade. Antonio Ricci (Lamberto Maggiorani) consegue um emprego após muita espera. Só que esse emprego, de colador cartazes na rua, lhe pedia como obrigação uma bicicleta. Ricci e sua mulher Maria (Lianella Carell) conseguem um dinheiro para uma, possibilitando que ele realize o seu trabalho. Há também o menino Bruno (Enzo Staiola), filho do casal. Fascinado por bicicletas, o menino cai de cabeça com o pai na busca pela bicicleta que lhes foi roubada, quando Ricci trabalhava apenas em seu primeiro dia.

    Possivelmente o filme mais famoso do movimento, apesar do enredo simples, o diretor explora muito bem o individualismo e a desolação no contexto do pós-guerra na Itália.


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