Game of Thrones: Qual o objetivo da saga criada por George R. R. Martin?

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Um texto sobre como a HBO ao contar essa história está rompendo paradigmas

 

Uma coisa que sempre me perguntei assistindo a série é:

Qual o objetivo?
Qual a moral da história?
Que mensagem querem passar?

É sobre os losers. Isso mesmo. Sobre os underdogs da vida. Aqueles que passam por você desde o colégio até a velhice e são sempre julgados como inferiores. É sobre o que eles precisam passar e superar pra conquistar muitas vezes o minimo de realização pessoal. É sobre como inconscientemente os classificamos e tentamos dizer qual é melhor ou pior.

Vou listar alguns personagens, apenas descrevendo-os:

De um lado da história temos uma família conservadora. Que dizem ser honestos e que pagam seus débitos, mas como todos que se vangloriam demais, possuem “seus podres”. Nessa linda família, temos o galã com cara de príncipe, mas que não é príncipe pra não deixar a história muito óbvia, por isso é como um daqueles atletas em ascensão que sofre uma lesão e nunca mais é o mesmo. Já sua irmã, que faz cara de santa  –  não pra quem a conhece -, é capaz de mandar matar o próprio marido e para proteger seus belos filhos.

Do outro lado temos uma família que realmente faz valer o nome. Não se dizem honrados. Eles colocam o certo em prática. Mas sabe como é, a irmã mais velha sonha em ser princesa, mas quando chega a hora de ter um relacionamento: os homens a maltratam de todas as formas a ponto de ser estuprada pelo próprio marido. Após estar calejada dos percalços da vida, hoje ouve investidas do mesmo que se dizia apaixonado por sua mãe, enquanto cuida de um reino em um ponto distante no mapa. A irmã mais nova é uma “menina moleque”. Te lembra aquela prima que é a melhor jogadora de futebol da rua e quebrou todos os amigos com quem brigou. O irmão do meio, depois de ser vítima de um “acidente”  –  hoje poderia ser equiparado ao de transito onde o culpado que não cumpre pena e não paga pela imprudência  –  se torna cadeirante e desenvolve problemas mentais. Ah! Essa família também resolveu criar um garoto, que um dia se tornou um cara barbudo, de cabelo grande e que tomou uma surra dos seus “amigos” e uma “facada no peito” ao saber da traição, mas superou e voltou a vida uns dias depois  –  lembrando muito uma parábola da mitologia cristã. Mitologia essa, que é totalmente patriarcal e que nunca colocou um homem se curvando a uma mulher seja lá qual o motivo.

Sobre nosso barbudo e cabeludo se curvar para uma mulher: Eu aposto que ele irá fazer em algum momento. Ainda mais por ser uma mulher tão sofrida quanto ele, já que foi vendida pelo irmão  –  que buscava retomar o poder familiar  –  e em sua lua de mel se tornou objeto sexual do seu marido, um líder de tribo também patriarcal a qual ela veio a liderar depois. Atualmente a mulher vendida pelo irmão, objeto sexual, a mais sofredora com seu nome, segue caminhando em direção aos seus objetivos e conta com um conselheiro e braço direito que é uma pessoa pequena, vulgarmente chamado de duende. Conselheiro este que sempre foi humilhado e colocado as margens da família. Mas, com uma boa oratória, poder de negociação, estratégia, honra e respeito pelo próximo fizeram dele um grande homem.

Ainda no time da rainha do mar de sofrimento, temos o negro que era escravo, foi castrado e criado em um ambiente hostil e violento, adestrado a seguir seu dono. Ele se torna uma pessoa gentil e carinhosa com sua amada e aparece na série sendo exemplo de como ser um cavalheiro  –  enquanto dizemos que homem agressivo é devido sua criação, enquanto o homem negro se torna um objeto sexual e/ou piada pelo que dizemos do tamanho do tamanho médio de seu órgão genital. Tratar sua amada com respeito, satisfaze-la psicológica e fisicamente mesmo sem um passado que o tenha preparado para isso – Enquanto isso, vamos para as redes sociais rir dos memes sobre como o “Ken e Barbie transam”.

Também não podemos esquecer do gordinho CDF, sem talento para ser guerreiro, ou cavaleiro, mas que consegue fazer um procedimento cirúrgico só lendo “tutoriais” encontrados sob as teias da biblioteca. E da mulher guerreira que em um ambiente dominados por homens, vence o mais amedrontador deles.

Você consegue ver as múltiplas jornadas de realização pessoal que cada um deles?

Consegue ver pelo que todos eles passaram para mostrar seu valor na posição que estão?

Consegue perceber que alguns nem queriam mostrar seu valor e só tentavam sobreviver ao ambiente hostil?

Agora quando você torcer para um personagem, vai perceber que está inconscientemente julgando seu status social. Julgando qual deles é mais merecedor. Qual deles sofreu mais e merece uma recompensa. Julgando-os por dores que você acha que conhece, ou pior: desconhece.

Em relação a série Game of Thrones, é óbvio que no início assistia pensando: “Quem morrerá primeiro?!“. Seria hipocrisia dizer que eu não tinha minhas crenças a respeito dos losers, mas ao perceber essa sutil mensagem de George R. R. Martim e HBO hoje posso refletir mais sobre essa questão. Se você nunca tinha pensado nisso, agora irá! Vai assistir a série e continuar torcendo por alguém? Sim. Mas enquanto se apegar em “ranquear” o sofrimento e o passado de pessoas em realidades que desconhecemos, por mais empático que se tente ser, não é correto. É pra deixar claro que nosso julgamento de sucesso a respeito de realizações materiais e pessoais são e vão continuar insuficientes. E ao tentarmos julgar os que possuem aparência frágil, aparentam ser perdedores e são chamados de “diferentes” a mão de Game of Thrones cresce pra dar um tapa na sua cara ao final da série.

Levei sete anos me perguntando, o que eles querem com cenas de mulheres sendo abusadas, sexo entre irmão, criança matando adultos e vice-versa. Está na hora de perceber o quão errado estamos em fazer esse tipo de avaliação, piadas, rir de pessoas em determinadas situações. Foram sete anos de cenas chocantes e plot twists enlouquecedores para te dizer que o mundo mudou; e mudou com força. Eu negro, pobre, acordo cedo e durmo tarde todo dia em busca de algum conhecimento, algo que me realize, que prove meu lugar no mundo e consiga fazer a diferença ao menos paras pessoas com quem me importo, e nesse meio tempo julgo e faço piadas de outros semelhantes. Diferentes em um ponto ou outro, porém semelhantes. E você faz o mesmo. Não minta. Eu sei que faz.

Provavelmente você pode achar que é exagero meu, que a série é apenas uma forma de entretenimento; por isso pergunto: O que você acha de cotas sociais? Qual a ordem de prioridade de cada uma dessas pessoas depois de “ranqueadas” no seu grupo? Ok, esse texto não é sobre cotas sociais. É sobre o quanto não somos empáticos quando deveríamos ser, ou ainda pior, quando fingimos ser com os chamados “losers“. E quando a história de Game of Thrones se concluir; quando você finalmente entender o que estavam te ensinando ao longo desses anos, vai perceber que apesar de diferentes, temos uma grande defeito: todos nós julgamos o próximo!

E aí, o que achou da teoria? Deixe seu comentário e lembre-se de nos acompanhar nas principais redes sociais!